quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Sobre os discursos na Assembléia Geral da ONU




Os dias têm sido movimentados para a diplomacia. Fanfarronices da diplomacia brasileira à parte no caso Zelaya-Chavez. Prefiro comentar os discursos na AG da ONU. Acabo de ouvir o do Chavez e acho que foi melhor do que ver um filme de comédia no cinema. Chavez pode ser um perfeito idiota, mas tem uma boa retórica, o que dá um ar de seriedade aos seus discursos. Ele flerta com Lula e com o socialismo. Diz que busca um socialismo renovado. Desde 1989 buscam algo assim, mas Lula é tudo, menos socialista. A idéia de focar em uma alternativa (bolivariana?) para mudar o sistema capitalista mundial é utópica demais e, no fim, me parece que todos gostam de ouvir Chavez, mas apenas com a finalidade de divertimento. Para ouvir alguém que ainda é idealista em um mundo realista.

O discurso de Obama foi interessante. Mostra-se claramente distante da diplomacia neo-conservadora de Bush e faz questão de demonstrar isso nos fórun multilaterais.
Como publica o NY Times: During his address to the General Assembly, Mr. Obama sought to present a kinder, gentler America willing to make nice with the world. He suggested that the United States would no longer follow the go-it-alone policies that many United Nations members complained isolated the Bush administration from the organization.

Ele conseguiu bons resultados na área das armas nucleares. Patrocinou uma resolução que foi aprovada por unanimidade no Conselho de Segurança hoje. A idéia é limitar e inspecionar todas as exportações de materiais físseis que podem ser usados para o desenvolvimento de armas nucleares. Ou seja, mesmo se o país não faz parte do TNP seria monitorado por inspetores que verificariam suas exportações vinculadas a esses materiais. O tema foi direcionado ao Irã e a Coréia do Norte é claro. E Obama conseguiu o apoio da China e da Rússia que, antes se mostravam relutantes em expandirem sanções contra o Irã.

Nas palavras de Obama: During his address to the General Assembly, Mr. Obama sought to present a kinder, gentler America willing to make nice with the world. He suggested that the United States would no longer follow the go-it-alone policies that many United Nations members complained isolated the Bush administration from the organization.

Apesar dos sucessos, os temas do Irã e do processo de paz entre Israel e Palestina permanece sem avanços. Discursos animadores são efêmeros para o Oriente Médio. Lembro-me do mesmo otimismo pairando sobre a reunião entre Clinton, Rabin e Arafat em 1993 e logo começou outra intifada estimulada pelo falecido Arafat.

Resumo: Ponto negativo para Lula e ponto positivo para Obama.

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

EUA abandonam do BMD na Polônia.





Do ponto de vista político, a decisão do governo Obama parece ser uma resposta aos contatos recentes com os russos. O "Ballistic Missile Defense" (sistema de defesa anti-mísseis) tem suas origens no período conhecido como "segunda Guerra Fria" quando o governo Reagan reaqueceu a disputa militar e tecnológica com a URSS e lançou o programa "Guerra nas Estrelas". Os investimentos foram pesados e, no fim, a URSS não conseguiu acompanhar os EUA.

Uma lógica da Guerra Fria que não teve fim em 1989 é o tema da dissuasão nuclear. EUA e Rússia somam juntos cerca de 4 mil ogivas nucleares e a contenção do poderio russo nunca deixou de ser um objetivo dos EUA e da OTAN na Europa, mesmo depois do fim da URSS. O grande problema do BMD é que a "destruição mútua assegurada" entre as grandes potências nucleares se perde e a dissuasão pode ter seus efeito maculado. Ou seja, a Rússia não teria a capacidade de retaliar os EUA se o BMD estivesse operacional na Polônia e Eslováquia e, obviamente, se demonstrasse acurácia. Isso é um grande problema para a dissuasão nuclear que sempre imperou durante a Guerra Fria, pois o princípio das armas nucleares era justamente esse, previnir que o adversário tomasse a iniciativa de usá-las, pois saberia que haveria retaliação e os objetivos políticos de um ataque com tais armamentos seriam perdidos.

O argumento para o abandono do BMD na Polônia foi o Irã. O relatório apresentado ao presidente Obama pelo Departamento de Defesa demonstra que o programa de mísseis iranianos não progrediu e que o maior perigo à segurança européia, os míssies de longo alcance, não foram e nem serão produzidos tão cedo por falta de capacidade tecnológica e vetores de lançamento. Trata-se de uma mudança em relação a idéia do mais armamentista do governo Bush. Contudo, a chave para a questão iraniana é justamente a Rússia.

Sabe-se que houve contrapartidas russas para o abandono do BMD na Europa. Por exemplo, uma declaração de neutralidade para garantir aos norte-americanos que os russos não vão transferir tecnologia nuclear para o Irã. A ONU e a UE já declararam um embargo nessa área para o Irã. Os EUA por sua vez, garantem aos russos a permanência da lógica da dissuasão. Na Ásia-Oriental o programda BMD foi bem sucedido em parceria com os japoneses e os chineses aumentaram seus gastos militares específicos para os mísseis de médio e longo alcance. Apesar de ser um desenvolvimento estritamente defensivo, o "dilema de segurança" ressurge. Desde a época em que Esparta percebeu que Atenas havia se tornado forte demais é assim! Elevações das preocupações com defesa em um Estado geram ansiedade e preocupaçõs com a defesa em outros Estados. Círculo-vicioso armamentista!

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

A Parceria Estratégica Brasil-França



A recente cooperação entre os governos brasileiro e francês representa uma enorme iniciativa de parceria estratégica na área de defesa com objetivos ambiciosos. Uma declaração conjunta foi lançada por ocasião da visita oficial do mandatário francês ao Brasil exaltando a parceria e consolidando os acordos. Os valores superam os R$ 20 bilhões e, por conta dos valores impressionantes, a parceria estratégica foi alvo de críticas. Os franceses se mostraram solícitos à cooperação, pois identificam no Brasil um parceiro essencial para o provimento de recursos naturais importantes.

O foco brasileiro é, sem dúvida, a área de defesa. Há décadas as forças armadas brasileiras vem passando por um desmonte e os investimentos tem sido meramente reativos, ou seja, para manutenção de equipamentos. Dos recursos destinados à defesa a maior parte vai para o pagamento dos efetivos. Percebe-se, portanto, que há uma incoerência entre a posição hegemônica do Brasil na América Latina e os investimentos na área de defesa.

A busca de um novo modelo de cooperação com os franceses é uma tentativa de minorar tais discrepâncias e assimetrias na área da tecnologia de defesa. O ambiente regional é entendido pelos militares brasileiros como “instável” e basta recordar alguns fenômenos políticos recentes na América Latina para entender tais preocupações: as comprar militares de Hugo Chaves e sua concepção militarista em relação aos sistemas políticos contrários a sua ideologia; a instabilidade gerada pelas guerrilhas colombianas, em especial as FARC; o narcotráfico e a porosidade das fronteiras e, por fim, a necessidade de dissuadir ameaças no oceano atlântico para defender as riquezas brasileiras em nossa Zona Econômica Exclusiva.




A parceria com os franceses é adequada e promissora porque pula etapas de inovação tecnológica que durariam, no mínimo, mais uma década no Brasil. Como por exemplo, é o caso do submarino nuclear. Os franceses, diferente dos norte-americanos, vão transferir tecnologia para o casco do submarino e construir junto com os brasileiros um dos submarinos convencionais aqui (modelo Scorpéne). Trata-se de aquisição de know-how fundamental para um país manter-se em posição de hegemonia regional. O projeto FX da Força Aérea, com a parceria, finalmente deve chegar ao fim e o Brasil dominará os ares da América Latina com caças de superioridade aérea (modelo Rafale). O fundamental nesses projetos de tecnologia de defesa é demonstrar às potenciais forças hostis a inutilidade de tentar atacar o Brasil, pois receberiam uma retaliação garantida e eficiência.

Além disso, a declaração conjunta recorda o uso dual da tecnologia militar e o maior intercâmbio entre Brasil e França nas áreas cultural e comercial. Com a implantação do acordo o Brasil terá benefícios tecnológicos gigantescos, além de se tornar uma potência naval respeitável capaz de dissuadir ameaças com sua força de submarinos. Nenhuma grande potência adquiriu tal status na história humana sem construir um poderio militar a altura de suas conquistas enquanto nação. O Brasil, finalmente, parece acordar para tal realidade.