sexta-feira, 1 de abril de 2011

O Japão Inabalável


O terremoto seguido por um tsunami que devastou a costa nordeste do Japão não é bem uma novidade para um país acostumado com tragédias. A situação mais grave é a de Fukushima, a 250 km de Tóquio, onde houve uma explosão na usina nuclear da cidade com vazamento radioativo. Cidades como Rikuzentakada e Minamisanriku têm mais da metade da população desaparecida, o que certamente elevará o número de mortos aos milhares.

Mas ainda assim, o povo japonês sabe que essa é uma dentre as várias tragédias experimentadas ao longo de sua história. O país é o mais bem preparado do mundo em equipes de salvamento e resgate de feridos em tragédias naturais e possui tecnologia de ponta para prever, monitoras e lidar com terremotos.

O que também ajuda a explicar o preparo japonês é a característica peculiar da geografia nipônica. A costa leste do país situa-se sobre uma falha geológica que divide duas placas tectônicas, a continental asiática e a do pacífico. Em outras palavras, é uma região propícia para abalos sísmicos.

No setor econômico as conseqüências do terremoto seguido por um tsunami parecem ser mais sérias. Os últimos levantamentos estatísticos feitos pelo governo japonês apontam gastos de U$30 bilhões. O Produto Interno Bruto nipônico deve cair de 1 a 2% este ano. A região mais devastada pela catástrofe natural não é fortemente industrial, mas com o setor energético do país, ainda dependente de energia nuclear, a indústria acabou sendo severamente afetada com as explosões na Usina Nuclear em Fukushima.

A estratégia do governo para reagir a essa crise é injetar dinheiro público para estimular a economia de modo geral, basicamente o consumo e empréstimos às empresas para reconstrução dos seus negócios. O governo deverá fazer a maior aplicação financeira de sua história, algo em torno de 183 bilhões de dólares. As empresas, de fato, precisarão de ajuda, firmas do setor automotivo como a Toyota e Honda e do setor tecnológico como a Sony e Toshiba já anunciaram perdas com as paralisações ocasionadas pelos terremotos. O setor de transportes também padece com vários danos estruturais em rodovias e ferrovias.

O fator agravante no caso japonês é o fato do país, antes do tsunami, já estar passando por uma crise econômica de baixo consumo interno e deflação, um verdadeiro cenário de recessão. As vidas perdidas e o perigo de contaminação da água são problemas com pesadas repercussões econômicas e, certamente, levará tempo até que os setores econômicos se reorganizem.

O yen, a moeda japonesa, tende a se valorizar em relação ao dólar, uma vez que em uma situação peculiar de crise, os investidores nacionais devem trazer suas reservas do exterior para melhorar suas situações financeiras e também para investir no esforço de reconstrução do país. As firmas de construção civil obtiveram valorização próxima a 40% na última semana. Esse retorno do fluxo de yens no país deve aumentar a demanda pela moeda incentivando, portanto, sua valorização.

Do ponto de vista da economia internacional. Alguns países como os EUA e a China podem sentir os efeitos provenientes das reduções das importações japonesas. No caso norte-americano ainda há o fato do Japão reduzir as comprar de títulos do tesouro do país. Isso pode causar pressão sobre a taxa de juros nos EUA.

A oportunidade gerada em situações de crises como a que passa o Japão é algo que os próprios japoneses já experimentaram na história. Parece estranho e nefasto dizer isto, mas na economia, as crises geram oportunidades. No caso japonês o estímulo será o gigantesco investimento governamental necessário a reconstrução da região nordeste do país.

Qual é o efeito de uma tragédia de grandes proporções sobre a psicologia social de uma nação? O caso japonês também é diverso. Uma grande potência é reconhecida por seus elementos de poder nacional como sua riqueza natural, sua economia, suas capacidades militares, mas também por características intangíveis como o moral e o caráter nacionais.

A antropóloga norte-americana Ruth Benedict estudou por muito tempo a cultura e sociedade japonesa a serviço do governo dos EUA, que buscava conhecer melhor seu inimigo durante a Segunda Guerra. Ela concluiu que os japoneses têm uma ética própria, diferente da ocidental, uma “ética de escolhas”. Ou seja, se esse caminho deu errado, nos preparamos e aceitamos outro. Foi o que ocorreu com o Japão ao fim da Segunda Guerra em 1945.

Após uma era militarista o Império do Japão se rendeu com 90% do país totalmente destruído. O país inteiro queimou com as bombas incendiárias lançadas pelos bombardeios norte-americanos em uma das guerras mais cruéis da história, a infra-estrutura japonesa foi reduzida a zero. Isso tudo foi antes das bombas nucleares serem lançadas sobre Hiroshima e Nagasaki!

O Japão ressurge, escolhe outro caminho, tem um espírito nacional coeso, uma força disciplinar indelével. Apenas vinte anos depois de o país estar totalmente destruído pela guerra, já havia se reconstruído com um novo projeto de Nação chamado de “potência civil-econômica” e já era a segunda maior economia do mundo.

O terremoto na cidade de Kobe em 1995 matou mais de 4 mil pessoas em apenas 20 segundos. Depois disso o governo japonês investiu pesado na tecnologia para predição de desastres e em uma engenharia adaptada a um terreno instável. Hoje, são líderes em ambas as áreas. O Japão ressurge. Não só pelo investimento em pesquisa de prevenção de desastres, mas principalmente pelo caráter nacional de seu povo, que permanece sendo uma lição para o Ocidente.

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